terça-feira, 29 de maio de 2018

O Conto da Aia _ The Handmaid's Tale / O livro e a série


O Conto da Aia – O Livro

Em primeiro lugar, vamos deixar bem claro:
“O Conto da Aia” não é um romance feminista.
Quem vende essa idéia ou nunca leu o livro, ou interpretou a história de forma equivocada.

A voz feminina que narra os acontecimentos mostra que tanto homens quanto mulheres podem ser extremamente cruéis. Pessoas que deturpam as palavras da Bíblia a seu favor, tirando frases do contexto ou usam apenas as partes que os favorecem.O patriarcado existe, mas ele só se mantém porque as mulheres dos Comandantes apóiam as decisões tomadas para o bem da nação.Uma nova ordem organizada por fanáticos religiosos que acreditam que a infertilidade das mulheres é um castigo de Deus, por causa do sexo sem compromisso, da homossexualidade e de todas as promiscuidades que eles jamais cometeriam.

Após um golpe de estado é criada a Republica de Gilead, onde não existe televisão, revistas, livros ou qualquer outro meio de comunicação_ pelo menos não para as mulheres _a vigilância é extrema e o medo faz com que, aqueles que não estão no poder fiquem em o silencio. Sob o olho dele

As Tias, mulheres designadas para doutrinar as Aias, usam várias passagens bíblicas para justificar a “posição sagrada” dessas mulheres que foram escolhidas para gerar novas vidas para a nação.Durante esse processo de doutrinação e lavagem cerebral, o que não falta é abuso de autoridade, humilhações, castigos e mutilações. Bem aventurados os mansos, pois eles herdarão a Terra

A situação não melhora muito quando as Aias vão para as casas dos Comandantes. Uma vez ao mês elas são estupradas por esses homens, com o consentimento e a presença de suas esposas durante o ato. Mas, segundo a passagem bíblica, Gênesis 30,  isso não tem problema algum, porque a própria esposa de Jacob, Raquel, pede para seu marido fertilizar a criada deles para que ela, Raquel, possa ter um filho... Bendito seja o fruto.

Mas no intimo as mulheres dos Comandantes não aceitam muito bem essa situação,  porque os abusos e humilhações contra as Aias continuam ou pioram. Algumas Aias enlouquecem e se matam ou sofrem falsas acusações e são condenadas a pena de morte.Tudo em nome de Deus

O Conto de Aia é um livro de reflexão sobre a política, o fanatismo religioso e sobre quem detêm o poder. Para alguns é apenas uma história de ficção distópica, para outros é quase uma profecia dos dias vindouros.Como a protagonista diz em uma passagem; tudo aconteceu aos poucos, não mudou de um dia para outro.

Na vida real, muitas “religiões” e seitas praticam coisas parecidas até hoje: poligamia, pedofilia, incesto, mutilação sexual feminina ... E os teonomistas infelizmente não são uma invenção da ficção literária. Eles estão entre nós e acreditam que as leis judiciais do Velho Testamento devem ser aplicadas na sociedade moderna. E como sabemos, nas histórias do velho testamento encontramos assassinatos, infanticídio, estupros... Olho por olho, dente por dente. Saber que pessoas subjugam outras dessa maneira, sem a menor dor na consciência e ainda acreditam estar agindo em nome de um deus é muito assustador.



“Estou me apaixonando”, dizíamos, “estou caidinha por ele" Éramos mulheres que caiam. Acreditávamos nisso, nesse movimento para baixo: tão adorável quanto voar, e ao mesmo tempo tão terrível, tão extremo, tão improvável. Deus é amor, disseram um dia, mas invertemos isso, e o amor, como o Céu, estava sempre ali, logo depois da esquina. Quanto mais difícil fosse amar aquele homem especifico ao nosso lado, mais acreditávamos no Amor, abstrato e total.Estávamos esperando, sempre, pela encarnação. A palavra tornada carne."

Art by Zoë van Dijk


O Conto da Aia – A série

Se ao ler o livro você pode se sentir desconfortável, assistir algumas cenas pode ser uma experiência até pior.

As humilhações que as Aias sofrem pelas Tias, os apedrejamentos, os seqüestros das crianças, a tomada de poder pelos militares religiosos e a bizarra cena da cerimônia de “fertilização” (vide estupro) das Aias. O livro mostra só uma das possibilidades do que o ser humano é capaz de fazer com o outro em busca do seu próprio beneficio.

As diferenças da série para o livro não são muitas. Pelo menos nessa primeira temporada os roteiristas foram fieis ao texto original. No livro não fica explicito como tudo aconteceu, as lembranças de Offred sobre sua “vida de antes” são vagos, quase como se ela não se lembrasse de seu passado. A tentativa de fuga do país, o seqüestro de sua filha, a morte de seu marido, tudo começa a se tornar cada vez mais distante e irreal.

Não existe uma explicação da tomada de poder, os primeiros conflitos...tudo isso fica por conta da imaginação do leitor. A partir dessa lacuna de informações os roteiristas conseguem criar o passado da protagonista June/Offred e também do inicio da Republica de Gilead.

Acertam ao contar o passado do casal Waterford, idealistas da rebelião teonomista e todo o desenvolvimento do governo e leis criados pelo grupo. Ao mostrar a amizade de June e Moira antes do evento, e dar mais espaço para a história de Moira.

A escolha de elenco feminino é muito bom.
Elisabeth Moss está perfeita como June/Offred, apenas com um olhar ela consegue passar os sentimentos conflitantes da personagem: medo, revolta, nojo, sarcasmo...mas ao mesmo tempo precisa engolir tudo isso e sorrir para não ser punida.

As excelentes atuações de Samira Wiley, Madeline Brewer, Alexis Bledel que interpretam as Aias. E temos também as autoritárias: Yvonne  Strahovski, que interpreta a esposa do Comandanteque, que é uma psicopata de primeira, e Tia Lydia; interpretada pela incrível Ann Dowd, fanática religiosa que doutrina as Aias na base do aguilhão de gado.

 O criador encontra sua criação> A escritora Margaret Atwood e Elisabeth Moss.
Na sequencia: 
Alexis Bledel, Samira Wiley, Ann Dowd, Madeline Brewer e Yvonne  Strahovski 
Foto> Victoria Stevens para W Magazine 

Já o elenco masculino, tenho minhas ressalvas.

Vamos ser sinceros, Joseph Fiennes perto dos 50 anos, continua muito bem fisicamente e com seu charme tipicamente inglês, difícil vê-lo como o comandante Waterford. Como sempre sua atuação é muito boa, e consegue dar um ar vilanesco ao personagem. 

O ator O.T Fagbenle, que interpreta o marido de June, precisa ter uma força maior, talvez na segunda temporada isso aconteça.Por enquanto sua participação na serie é só ok.

E a escolha que menos faz sentido é a do ator Max Minghella, que interpreta o motorista Nick, ele é totalmente inexpressivo na voz, olhar...não passa a importância que o personagem tem na trama. Sabe o famoso q.i ? Parece que foi assim que ele ganhou o papel.

A segunda temporada começa agora em Abril, vamos aguardar as mudanças e reviravoltas das histórias que ficaram em aberto e o que acontecerá aos personagens. Pois agora tudo pode tomar um rumo diferente, já que pelo menos 80% da história do livro já foi adaptada.


 Joseph Fiennes, O.T Fagbenle e Max Minghella


 ***Spoiler***
No livro os personagens masculinos são bem diferentes de várias maneiras :

*   O marido de June morre durante a fuga, simples assim.

** O comandante Waterford descrito no livro seria mais ou menos o Harrison Ford nos anos 1990. Um senhor bem apessoado, na faixa dos 60 anos, com cabelos brancos, educado e que até sente um tipo de compaixão para com June/Offred, apesar de tudo.

*** O motorista Nick é um dos personagens enigmáticos.Você só vai entender suas reais intenções ao final do livro. Ele é um dos subordinados do Comandante, um homem por volta dos seus 40 anos, alto, magro_ alguém parecido com o ator Paul Bettany por exemplo_ que dentro da nova Republica não pode ter nada; uma casa, uma família, uma mulher.Porque na “vida de antes” ele era um Zé ninguém e nessa continua do mesmo jeito. Muitas Aias o consideram um “Olho”: espiões infiltrados para vigiar/denunciar as Aias e até mesmo dos Comandantes.

O CONTO DA AIA  (1985)
AUTOR : MARGARET ATWOOD
EDITORA : ROCCO
ISBN : 9788532520661

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