quinta-feira, 14 de setembro de 2017

GUIA DE LEITURA - PARA CONHECER O PUNK ROCK




Muitos críticos dizem que tudo começou nos EUA, ao som das guitarras destrutivas dos Stooges e com as poesias de Patti Smith.Podemos dizer que pela ordem cronológica foram os americanos, mas muitos acreditam que foram os ingleses que deram a forma e o sentido para o movimento. Seja como for, mesmo em sua curta vida, é inegável a transformação que o cenário musical sofreu após o surgimento do punk rock. 

“Punk” era o nome de uma revista/fanzine escrita por fãs de rock, sem nenhuma experiência jornalística, feita totalmente na raça. As matérias eram sobre comportamento, artes e as novas bandas da época: Velvet Underground, New York Dolls, MC5, Television, Talking Heads, Ramones.

Não existia um movimento, uma nova ideologia ou algo parecido. A musica naquele momento estava apenas se transformando em algo mais poético, violento ou visceral. O musica “paz e amor” não fazia mais sentido, a guerra do Vietnã estava perdida, os ídolos daquela época começam a morrer : Janis, Jim e Jimmy.

Na década de 1970, a juventude não acredita em mais nada, as drogas tomam conta do país. Heroína, cocaína, LSD, anfetaminas e outras drogas, começam a fazer parte do dia a dia das metrópoles. No principio são como canalizadores para experiências extra-sensoriais e “ajudam” no processo criativo...mas nós já sabemos como isso termina, não é mesmo?

No outro lado do Atlântico, a velha UK estava carente por um cenário musical. Muita psicodelia sem sentido, muitas musicas com solo de guitarra de 5 minutos.A juventude também estava frustrada; sem emprego, sem lugar para morar e sem futuro.

Quando o jovem empresário britânico Malcolm McLaren levou os New York Dolls para o Reino Unido ele deu o primeiro passo para a criação de uma nova geração musical. Os New York Dolls fugiam dos padrões tanto em sua musica quanto em seu visual. Eles atingem o sucesso na Inglaterra e logo após conseguem certa notoriedade em seu próprio pais, EUA . Mas as drogas são mais importantes para alguns membros do grupo e eles se separam logo após seu segundo álbum.

Depois de assimilar o que estava acontecendo nos EUA, Malcolm McLaren volta para a Inglaterra e pensa: “Porque não criar um movimento e também uma banda?” O nome estava lá o tempo todo: PUNK e a banda: Sex Pistols.

Durante os anos de 1975 até 1977 os jovens ingleses tomam dos EUA o movimento da contra cultura. Manifestam sua fúria contra as políticas já estabelecidas, a pobreza, a falta de futuro e a monarquia. A música torna-se uma arma, as roupas uma afronta contra a sociedade.Existe uma coerência dentro do caos, um porquê da revolta e da frustração.

Os Sex Pistols aparecem no cenário musical, sem um álbum, apenas com alguns “singles” e os polêmicos shows que criam a áurea necessária para virar tudo de ponta cabeça. Eles são sujos, feios, não sabem tocar instrumentos ou cantar. As letras possuem uma mensagem simples e clara : Foda-se tudo porque nós já estamos fudidos.

No livro “Mate-me por favor” fica claro que os americanos querem puxar a “sardinha” para eles, que se consideram os "únicos" criadores do punk, desde a sua concepção até sua morte. Muitas bandas inglesas importantes que surgiram nessa época não são citadas : Generation X, Siouxsie and the Banshees, The Dammed, Joy Divison. 

Até o The Clash, que fez mais sucesso nos EUA do que em seu próprio pais virou apenas uma nota de rodapé ! O capitulo sobre os Sex Pistols no livro é um dos mais curtos, onde o foco é voltado para o amor destrutivo da groupie Nancy Spungen e o baixista Sid Vicious.

Indiferente de qualquer rivalidade, o livro continua sendo um dos registros mais completos, que começa em 1967 e vai até 1980. Quem conta as historias são os integrantes das bandas, empresários, rodies e também as groupies. As entrevistas são transcritas em ordem cronológica e sempre fazem as conexões com o próximo personagem. É quase como ver um documentário, o que é muito bom pois não existe um narrador que possa desviar sua atenção com opiniões, acrescentando ou omitindo informações. 

Também existe as “verdades” que cada um desses personagens quer contar; as melhores histórias, sem dúvida, são dos Ramones e do genial Iggy Pop.   



 “Alguém come centopéias gigantes?” é um dos melhores livros que li até hoje sobre o punk underground americano. “Alguém ...”  é uma compilação de entrevistas publicadas pelo zine independente chamado “Search & Destroy” entre 1977 -79. São 15 entrevistas conduzidas pelo editor, escritor-entrevistador e faz tudo V.Vale. Aliás quem selecionou as entrevistas foi ninguém menos que nosso Reverendo Fábio Massari !

Importantes artistas, tanto na musica, artes e literatura estão no livro : Patti Smith, The Cramps, The Clash, Burroughs, J.G Ballard...  E , mesmo que você não conheça todos, a descoberta dessas figuras singulares através das entrevistas podem abrir as portas da percepção para novos e inusitados mundos.  

No Brasil o movimento punk demorou para acontecer. Assim como na Inglaterra, a musica atingiu principalmente os jovens da periferia, aqueles que pararam de estudar para trabalhar e pagar as contas de casa. Existia uma mistura de fúria e frustração de uma juventude desiludida com o presente e com medo do futuro.

Época complicada para todos os brasileiros que  viviam com as mudanças políticas e sociais. A censura ainda existia, os militares davam as ordens ao mesmo tempo que a ditadura dava os últimos suspiros.

O escritor Marcelo Rubens Paiva conta com maestria, como era ser jovem nessa época no livro “Meninos em Fúria”. Inicialmente uma biografia do vocalista Clemente da banda Inocentes, virou uma espécie de documentário biográfico dos dois amigos que se conheceram no começo do movimento punk paulistano em um show na USP.

Os primeiros capítulos são quase mini-aulas de história, onde Paiva conta sobre o momento político e cultural da época. São cronicas de uma época onde nem tudo era bacana e colorido como Rock'n'Rio, Blitz e RPM... O rock em SP era sangue nos olhos, as letras, em tom de discurso, eram contra o governo, a censura e repressão da ditadura. Existia a rivalidade e os confrontos entre o pessoal do ABC e da capital, que sempre terminavam em brigas feias. 

Paiva escreve de forma rápida e direta, enquanto Clemente está mais para um diário de lembranças. Isso não tira o mérito do livro, é bem interessante ter estes dois pontos de vista. Vale a pena ler por ser um registro muito bom do começo do punk no Brasil. Mas por outro lado, faltam mais informações e outras vozes dessa mesma época. É lógico que o foco é a vida do Clemente, só que, nos ultimos capítulos algumas informações sobre a vida dele são bem desnecessárias...como por exemplo; onde a filha dele estudou !

Que esse livro dê um start para que outros títulos sobre o rock/punk/metal brasileiro sejam publicados.
Hey Ho let’s Go !! 



MATE-ME POR FAVOR ( A HISTÓRIA SEM CENSURA DO PUNK)
AUTORES : LEGS MCNEIL & GILLIAN MCCAIN
EDITORA : L&PM
ISBN : 9788525407375

ALGUÉM COME CENTOPIAS GIGANTES ?
AUTOR : V. VALE  ( ORG: FABIO MASSARI )
EDITORA : EDIÇOES IDEAL
ISBN : 9788562885419

MENINOS EM FÚRIA – E O SOM QUE MUDOU A MÚSICA PARA SEMPRE
AUTORES : MARCELO RUBENS PAIVA & CLEMENTE TADEU NASCIMENTO
EDITORA : ALFAGUARA
ISBN : 9788556520258