quinta-feira, 2 de novembro de 2017

GUIA DE LEITURA _ Jo Nesbo e Harry Hole



Quando você pensa em histórias de detetives sempre lembra dos personagens clássicos: Sherlock, Marlowe, Poirot, Espinosa, Miss Marple.

Eles conseguem ser tão convincentes em suas excentricidades, inteligência, astúcia, defeitos e qualidades que já foram confundidos com pessoas reais e algumas vezes o nome de seu criador nem é lembrado.

Quando Arthur Conan Doyle matou Sherlock Holmes no conto “O problema final”, nunca imaginou que seus leitores ficariam tão revoltados com a morte do personagem. O escritor era abordado na rua e recebia cartas e mais cartas pedindo uma explicação sobre a morte prematura de Holmes. A verdade era que Doyle estava cansado do personagem e escrever somente sobre o detetive restringia sua criatividade. Chegou a dizer para sua mãe: “Sherlock  priva minha mente de coisas melhores” (?!?)

Não adiantou.
O criador virou escravo de sua criatura e Doyle teve que “ressuscitar” Sherlock.

Será que acontecerá o mesmo com Jo Nesbo e seu detetive Harry Hole ? 
O próprio escritor já declarou que um dia terá que dar fim ao personagem e não vai ter volta. Ele disse isso na época do lançamento do oitavo livro:“O leopardo” mas até agora, já estamos no décimo primeiro livro da saga e Harry Hole ainda está vivo.



GUIA DE LEITURA >>>

Quem é Harry Hole ? 
Posso começar a ler “Boneco de Neve” antes dos outros livros ? 
Existe uma ordem de leitura? 

Estas eram as perguntas que eu mais respondia na época em que trabalhava na livraria.
O publico leitor de suspense já estava cansado da mesma receita usada nos romances policiais americanos: investigação, ação/porrada, desfecho sem graça e previsível. E começa a mudar seu gosto depois que passa a ler e conhecer os escritores escandinavos: Mankell, Indridason, Lackberg e Larsson. Autores que trouxeram um estilo de escrita mais lento, descritivo, tramas mais elaboradas, personagens complexos e mortes ultraviolentas. Jo Nesbo consegue misturar o melhor dos dois mundos: ação e porrada com a as tramas elaboradas e mortes violentas. E cria o detetive mais carismático, problemático, alcoólatra e sangue nos olhos da literatura   

Vamos as respostas :

Harry Hole é uma mistura de muitos detetives da literatura e da televisão também.Mas se for para comparar, ele é a versão hardcore de Philip Marlowe; personagem criado por Raymond Chandler na década de 1940.

Harry é o típico detetive galã decadente, fuma, bebe muito, muito mesmo! Tem poucos amigos, uma namorada que já o dispensou algumas vezes e vários fantasmas que o assombram. Mas é o melhor detetive da Noruega e o único que consegue entender e desvendar os crimes mais violentos.

A escolha do ator Michael Fassbender para encarnar o personagem nas telas foi o mais acertado da história do cinema. As características de idade e porte físico são as mesmas de Harry Hole. E se o primeiro filme for um sucesso, Fassbender vai interpretar o detetive por um bom tempo.Vamos esperar!

Posso ler “Boneco de Neve” antes dos outros livros ?

Sim ! Pode ler sem problema.
Nesse livro as características do personagem estão bem definidas. Ao longo da história vamos descobrir que Harry é um cara amargurado e desconfiado. Que não está mais com o grande amor de sua vida e tem umas “tretas” com alguns colegas de trabalho.Também descobrimos o quanto seu alcoolismo pode prejudicar e as vezes até ajudar (?) nas investigações. O livro possui as mortes mais bizarras e insanas que você irá ler em um romance policial.

Na maioria dos livros de suspense você tem duas ou três “viradas” na história. A “virada” é aquela hora que você já juntou todas as pistas, prestou atenção em todos os detalhes e já sabe até quem é o assassino....só que não !!! Jo Nesbo sempre dobra esse numero em praticamente todos os seus livros. Genial.


Existe uma ordem de leitura, posso começar por qualquer livro?

É interessante começar pelo primeiro:“Morcego” 
Mas não é necessário.
Todos os livros antes de “Boneco de Neve” possuem histórias independentes.Você vai entender perfeitamente o que está acontecendo na trama. Existem referencias de casos passados mas não são spoilers e Nesbo sempre tem o cuidado de reapresentar os personagens que fazem parte da vida do detetive e apareceram nos livros anteriores.

Depois de “Boneco de Neve”, Nesbo começou a conectar mais as histórias tanto que os livros “Leopardo” e “Fantasma” seguem quase como uma seqüência e “Policia” só quem já leu pelo menos uns cinco livros da série vai entender a trama.

A editora Record nunca seguiu a ordem de lançamentos dos livros da saga Harry Hole.
Os primeiros livros faziam parte da antiga Coleção Negra: “Garganta Vermelha” e “A casa da dor”, terceiro e quarto livro respectivamente. 
“A estrela do diabo” e “O redentor” você pode ter a sorte de encontrar em algumas livrarias e sebos: mas por enquanto todos estão esgotados na editora. Provavelmente com a estréia do filme estas edições serão relançadas com novas capas e poderemos completar nossas coleções.

EXTRA >>>  Book trailer do Boneco de Neve  


Jo Nesbo e sua pequena estante de livros 



quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Stephen King e as Mulheres




Todo romancista tem seu estilo, sua maneira de contar a história, de nos guiar pelo universo que ele criou e nos apresentar seus personagens.
Quando viramos fãs desse escritor percebemos todas essas pequenas nuances, sabemos mais ou menos como a história irá se desenrolar, podemos ter ótimas surpresas e grandes decepções e mesmo ao final do livro, reclamando ou aclamando, nós sempre queremos mais. E quando esse mesmo autor nos mostra um novo livro, lá estamos nós na fila pra comprar.

É assim com grande parte dos fãs de Stephen King que já conheci. Temos discussões acaloradas sobre os melhores e piores finais, adaptações para seriados e cinema. Mas parece que sempre entramos em consenso sobre uma coisa, o quanto as personagens femininas são fortes e predominantes em boa parte da obra de King.

Talvez tudo começou com algo inconsciente, algo que Freud explicaria ? Quem sabe.

Quando o pai de SK foi embora de casa deixando dois filhos, Stephen com 2 anos e David com 4, quem teve que segurar a barra sozinha foi a mãe, que se tornou a base para a formação, de muitas maneiras, do escritor que conhecemos hoje.

A mãe de SK era uma leitora voraz e quando tinha algum tempo para ficar com os filhos - geralmente trabalhava mais de 10 horas por dia para sustentar a família - sempre lia histórias e contos de terror para os dois. Já na adolescência, quando SK começa a escrever e sua mãe o incentiva “comprando” estes contos, a qual ela pagava alguns centavos por histórias inéditas.

No livro “Sobre a escrita” King conta essa história na primeira parte, que é uma mini biografia.Você percebe o quanto SK reconhece e admira sua mãe e como isso reflete nas personagens ficcionais que ele criou durante todos esses anos. São mulheres que vão sofrer, são prejudicadas de várias maneiras, abusadas algumas vezes mas estão sempre prontas pra luta e na maioria das vezes ganham a batalha.

E não podemos esquecer de sua esposa Tabitha, que segundo ele conta foi amor a primeira vista, ou risada.

“Em um dia quente de verão, no fim de julho, um bando de ratos de biblioteca almoçava no gramado que ficava atrás da livraria da universidade.Sentada entre Paolo Silva e Eddie Marsh estava uma garota linda, com uma risada rouca, cabelos tingidos de vermelho e as pernas mais lindas que eu já tinha visto na minha vida sob uma minissaia amarela. Eu nunca tinha esbarrado com ela na biblioteca e não acreditava que uma estudante universitária pudesse ter uma risada tão maravilhosa e destemida.(...) O nome dela era Tabitha Spruce. Nós nos casamos um ano e meio depois.”

Tabitha também teve um papel crucial na recuperação de King, principalmente quando, no inicio do sucesso ele começou a pegar pesado com as drogas e álcool. Segundo o próprio escritor, sua mulher teve que segurar um verdadeiro rojão ao ter que cuidar de 3 crianças e um marido viciado e SK agradece até hoje por sua mulher não ter desistido dele.

Stephen King estava anos luz antes do termo “empoderamento feminino” existir.

Em todos os livros da obra de SK que já li - e não são poucos – nunca vi uma personagem feminina ser apenas a vitima, a personagem de apoio, a mocinha pronta pra se apaixonar ou servir apenas como objeto sexual.

Na matéria abaixo - "As mulheres..." -  está uma lista das suas principais personagens femininas, muitas protagonistas inesquecíveis da literatura e algumas vezes bem representadas no cinema também.

Boa Leitura !   

sábado, 7 de outubro de 2017

Guia de Leitura _ As Mulheres de Stephen King




Wendy Torrance >“O Iluminado”>> Se você só viu o filme, por favor, leia o livro e tire para sempre a imagem da mulher histérica, gritando apavorada pelos corredores do Hotel Overloock. A personagem interpretada pela atriz Shelley Duvall, que há alguns anos contou a tortura psicológica que sofreu pelo diretor Stanley Kubrick para dar mais “dramaticidade” as cenas,  jamais teria passado por nenhum trauma se o roteiro seguisse corretamente o livro. A atriz interpretaria uma mãe forte que protege seu filho de um marido alcoólatra logo no começo do livro e durante todo o processo da crescente loucura de Jack Torrance ela está ciente que algo está errado e não tem medo de enfrenta-lo.
Stephen King fala sobre o Iluminado de Kubrick


Annie Wilkes >“Misery”>> Sem sombra de dúvida, a personagem mais louca e psicopata de todas criada por King. Não deixa de ser uma mulher forte, a fã numero um que todo escritor quer ter bem longe, de preferência em um manicômio.

Dolores Claiborne >“ Eclipse Total”>> Não é qualquer escritor que escreve em primeira pessoa como uma mulher e convence, mas mestre que é mestre sabe o que faz. A personagem Dolores é uma mulher com mais de 60 anos que já passou por muita coisa e luta com a vida que leva, acusações, sua família e suas memórias. É uma das narrativas mais intimistas e dramáticas escritas por King.

OBS >>  A incrível atriz Kathy Bates interpretou as duas personagens no cinema. E mesmo com uma adaptação aqui e ali, os filmes seguem exatamente a narrativa dos livros.

Sophia Lillis >“IT_A Coisa”>> Essa menina sofre, sofre e sofre, mas continua em pé e lidera uma turma de meninos para matar um palhaço assassino dos infernos. Existem algumas diferenças entre o filme e o livro, onde as cenas são mais chocantes e violentas, principalmente o bullying na escola e o abuso do pai. E pensar que SK escreveu a história muitas décadas antes do chamado empoderamento feminino aparecer na mídia ...      

Susannah Dean/Odetta Holmes/Detta Walker > "A Torre Negra”>> Uma das minhas personagens preferidas. Inicialmente conhecemos a história de Odetta, uma jovem ativista do movimento dos direitos civis dos negros nos anos 1960. Em sua juventude foi vitima de uma tentativa de assassinato que causou a perda de suas pernas e a deixou em coma. Quando Odetta acorda, uma segunda personalidade vem à tona: Detta Walker. Sarcástica, desbocada e sempre pronta pra briga. O que pode ser de grande ajuda em alguns casos e um perigo em outros.Quando a personagem encontra Eddie Dean e os dois se apaixonam, ela adota o nome de Susannah e a personalidade Detta fica em  repouso por algum tempo. Uma mulher com personalidade forte e independente, ela é essencial para toda a construção da mitologia da Torre Negra.  

Susan Delgado > “A Torre Negra” >> A linda garota do baronato de Mejis encontra com o jovem pistoleiro Roland e os dois se apaixonam de imediato. Não é só isso não ! Susan é uma das peças indispensáveis dentro de um arco da história onde a personalidade de Roland é formada.
Ela também tem alma de guerreira e, ao tentar ajudar Roland a proteger o vilarejo coloca sua própria vida em risco. A historia de Susan é contada no livro “Mago e Vidro”, quarto volume da serie. Todos sabemos que SK não é lá muito romântico, mas aqui temos as passagens mais apaixonantes da sua literatura, e quando ele descreve a cena de amor entre os dois personagens, duvido que você não se emocione.   
 
Jessie Burlingam > “Jogo Perigoso”>> Leia “Jogo Perigoso” e pense três vezes antes de usar algemas na cama para apimentar a relação. O casamento de 20 anos de Gerald e Jessie não está lá muito bem, principalmente na parte sexual, então Gerald tem a brilhante idéia de algemar sua mulher na cama mas a coisa sai fora do controle e ele morre. Imagine estar amarado em uma cama, com um morto ao seu lado, sem roupas, um copo de água em uma escrivaninha e as chaves das algemas fora de seu alcance. Isso sem contar que aparece uma cara no meio da noite só pra verificar quando você vai morrer? Sem mais spoilers.

Donna Trendon > “Cujo”>> Outra mãe que tenta proteger seu filho, só que desta vez é do diabo em forma de cão. Até hoje SK não lembra muito bem como escreveu esse livro.Era a época em que ele estava pegando pesado com as drogas e o álcool e também na qual mais recebeu o apoio de sua esposa Tabitha para sair dos vícios.

Bobbi Anderson > “Os Estranhos”>> A personagem é quase uma versão feminina de SK e reflete bem a crise da dependência das drogas que o autor viveu. Uma poeta/escritora  alcoólatra que se isola em uma casa na floresta para enfrentar seus medos e acaba encontrando uma nave alienígena no quintal. Como é que é ?!?! É isso mesmo! Mais um livro da época sombria do escritor e um dos mais sem noção também. O que salva são os pensamentos e questionamentos da personagem, onde podemos ver o brilhantismo da escrita de King dar o ar da graça nesse livro de 600 páginas.

Lisey Landon > “LOVE – A historia de Lisey”>>Não é um dos meus livros favoritos mas possui boas passagens e algumas bem comoventes. Lisey é viúva de um escritor famoso e não consegue seguir em frente mesmo depois de 2 anos da morte do marido. Quando Lisey começa a descrever a relação com Scott e o quanto ela está perdida e desamparada sem ele, consegue nos cativar e assim damos continuidade a leitura. Tem uma reviravolta do meio para o final que fica um tanto estranha, mas é nesse ponto que a personagem mostra toda sua força.  

Carrie White > “Carrie, a estranha”>> Foi a primeira protagonista escrita por SK e uma das mais famosas. O manuscrito foi parar na lata do lixo e SK agradece até hoje sua esposa por salva-lo, apostar na história e insistir para termina-la. Carrie é baseada em várias garotas que o escritor conheceu na juventude. Meninas que sofriam bullying, eram abusadas pelos pais e sofriam em silencio. Foi nessa hora que ele pensou: e se elas pudessem se vingar? O que fariam?

Charlie McGee > “A incendiaria”>> Esse foi o terceiro livro do King que li quando eu tinha meus 13/14 anos. A personagem era uma criança com poderes paranormais e colocava fogo em qualquer coisa que via na sua frente. Mesmo sendo adolescente na época, não me identifiquei com a personagem. A historia também era confusa, tinha algo com experiências genéticas _alguém disse X-Men ? _ e acho que só terminei a leitura porque era um verdadeiro desafio chegar ao final de um livro com mais de 300 páginas. Mas tem seu mérito, principalmente por colocar uma menina como protagonista de um livro de terror.     

*** Estes são os romances que li até hoje. Existem muitas personagens femininas protagonistas em vários outros livros de contos de SK que não estão aqui. Mas posso fazer uma nova lista no futuro, quem sabe ?!?

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

GUIA DE LEITURA - PARA CONHECER O PUNK ROCK




Muitos críticos dizem que tudo começou nos EUA, ao som das guitarras destrutivas dos Stooges e com as poesias de Patti Smith.Podemos dizer que pela ordem cronológica foram os americanos, mas muitos acreditam que foram os ingleses que deram a forma e o sentido para o movimento. Seja como for, mesmo em sua curta vida, é inegável a transformação que o cenário musical sofreu após o surgimento do punk rock. 

“Punk” era o nome de uma revista/fanzine escrita por fãs de rock, sem nenhuma experiência jornalística, feita totalmente na raça. As matérias eram sobre comportamento, artes e as novas bandas da época: Velvet Underground, New York Dolls, MC5, Television, Talking Heads, Ramones.

Não existia um movimento, uma nova ideologia ou algo parecido. A musica naquele momento estava apenas se transformando em algo mais poético, violento ou visceral. O musica “paz e amor” não fazia mais sentido, a guerra do Vietnã estava perdida, os ídolos daquela época começam a morrer : Janis, Jim e Jimmy.

Na década de 1970, a juventude não acredita em mais nada, as drogas tomam conta do país. Heroína, cocaína, LSD, anfetaminas e outras drogas, começam a fazer parte do dia a dia das metrópoles. No principio são como canalizadores para experiências extra-sensoriais e “ajudam” no processo criativo...mas nós já sabemos como isso termina, não é mesmo?

No outro lado do Atlântico, a velha UK estava carente por um cenário musical. Muita psicodelia sem sentido, muitas musicas com solo de guitarra de 5 minutos.A juventude também estava frustrada; sem emprego, sem lugar para morar e sem futuro.

Quando o jovem empresário britânico Malcolm McLaren levou os New York Dolls para o Reino Unido ele deu o primeiro passo para a criação de uma nova geração musical. Os New York Dolls fugiam dos padrões tanto em sua musica quanto em seu visual. Eles atingem o sucesso na Inglaterra e logo após conseguem certa notoriedade em seu próprio pais, EUA . Mas as drogas são mais importantes para alguns membros do grupo e eles se separam logo após seu segundo álbum.

Depois de assimilar o que estava acontecendo nos EUA, Malcolm McLaren volta para a Inglaterra e pensa: “Porque não criar um movimento e também uma banda?” O nome estava lá o tempo todo: PUNK e a banda: Sex Pistols.

Durante os anos de 1975 até 1977 os jovens ingleses tomam dos EUA o movimento da contra cultura. Manifestam sua fúria contra as políticas já estabelecidas, a pobreza, a falta de futuro e a monarquia. A música torna-se uma arma, as roupas uma afronta contra a sociedade.Existe uma coerência dentro do caos, um porquê da revolta e da frustração.

Os Sex Pistols aparecem no cenário musical, sem um álbum, apenas com alguns “singles” e os polêmicos shows que criam a áurea necessária para virar tudo de ponta cabeça. Eles são sujos, feios, não sabem tocar instrumentos ou cantar. As letras possuem uma mensagem simples e clara : Foda-se tudo porque nós já estamos fudidos.

No livro “Mate-me por favor” fica claro que os americanos querem puxar a “sardinha” para eles, que se consideram os "únicos" criadores do punk, desde a sua concepção até sua morte. Muitas bandas inglesas importantes que surgiram nessa época não são citadas : Generation X, Siouxsie and the Banshees, The Dammed, Joy Divison. 

Até o The Clash, que fez mais sucesso nos EUA do que em seu próprio pais virou apenas uma nota de rodapé ! O capitulo sobre os Sex Pistols no livro é um dos mais curtos, onde o foco é voltado para o amor destrutivo da groupie Nancy Spungen e o baixista Sid Vicious.

Indiferente de qualquer rivalidade, o livro continua sendo um dos registros mais completos, que começa em 1967 e vai até 1980. Quem conta as historias são os integrantes das bandas, empresários, rodies e também as groupies. As entrevistas são transcritas em ordem cronológica e sempre fazem as conexões com o próximo personagem. É quase como ver um documentário, o que é muito bom pois não existe um narrador que possa desviar sua atenção com opiniões, acrescentando ou omitindo informações. 

Também existe as “verdades” que cada um desses personagens quer contar; as melhores histórias, sem dúvida, são dos Ramones e do genial Iggy Pop.   



 “Alguém come centopéias gigantes?” é um dos melhores livros que li até hoje sobre o punk underground americano. “Alguém ...”  é uma compilação de entrevistas publicadas pelo zine independente chamado “Search & Destroy” entre 1977 -79. São 15 entrevistas conduzidas pelo editor, escritor-entrevistador e faz tudo V.Vale. Aliás quem selecionou as entrevistas foi ninguém menos que nosso Reverendo Fábio Massari !

Importantes artistas, tanto na musica, artes e literatura estão no livro : Patti Smith, The Cramps, The Clash, Burroughs, J.G Ballard...  E , mesmo que você não conheça todos, a descoberta dessas figuras singulares através das entrevistas podem abrir as portas da percepção para novos e inusitados mundos.  

No Brasil o movimento punk demorou para acontecer. Assim como na Inglaterra, a musica atingiu principalmente os jovens da periferia, aqueles que pararam de estudar para trabalhar e pagar as contas de casa. Existia uma mistura de fúria e frustração de uma juventude desiludida com o presente e com medo do futuro.

Época complicada para todos os brasileiros que  viviam com as mudanças políticas e sociais. A censura ainda existia, os militares davam as ordens ao mesmo tempo que a ditadura dava os últimos suspiros.

O escritor Marcelo Rubens Paiva conta com maestria, como era ser jovem nessa época no livro “Meninos em Fúria”. Inicialmente uma biografia do vocalista Clemente da banda Inocentes, virou uma espécie de documentário biográfico dos dois amigos que se conheceram no começo do movimento punk paulistano em um show na USP.

Os primeiros capítulos são quase mini-aulas de história, onde Paiva conta sobre o momento político e cultural da época. São cronicas de uma época onde nem tudo era bacana e colorido como Rock'n'Rio, Blitz e RPM... O rock em SP era sangue nos olhos, as letras, em tom de discurso, eram contra o governo, a censura e repressão da ditadura. Existia a rivalidade e os confrontos entre o pessoal do ABC e da capital, que sempre terminavam em brigas feias. 

Paiva escreve de forma rápida e direta, enquanto Clemente está mais para um diário de lembranças. Isso não tira o mérito do livro, é bem interessante ter estes dois pontos de vista. Vale a pena ler por ser um registro muito bom do começo do punk no Brasil. Mas por outro lado, faltam mais informações e outras vozes dessa mesma época. É lógico que o foco é a vida do Clemente, só que, nos ultimos capítulos algumas informações sobre a vida dele são bem desnecessárias...como por exemplo; onde a filha dele estudou !

Que esse livro dê um start para que outros títulos sobre o rock/punk/metal brasileiro sejam publicados.
Hey Ho let’s Go !! 



MATE-ME POR FAVOR ( A HISTÓRIA SEM CENSURA DO PUNK)
AUTORES : LEGS MCNEIL & GILLIAN MCCAIN
EDITORA : L&PM
ISBN : 9788525407375

ALGUÉM COME CENTOPIAS GIGANTES ?
AUTOR : V. VALE  ( ORG: FABIO MASSARI )
EDITORA : EDIÇOES IDEAL
ISBN : 9788562885419

MENINOS EM FÚRIA – E O SOM QUE MUDOU A MÚSICA PARA SEMPRE
AUTORES : MARCELO RUBENS PAIVA & CLEMENTE TADEU NASCIMENTO
EDITORA : ALFAGUARA
ISBN : 9788556520258

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

MINI GUIA DE LEITURA - "Mr.Mercedes" de STEPHEN KING



Stephen King possui os títulos de mestre do terror e do fantástico.
E alguns de seus críticos mais ferrenhos gostam de um outro titulo: mestre da embromação.

Mas somente nós, seus fieis fãs, que dedicamos horas e horas lendo seus livros sabemos que King também é mestre em criar personagens que parecem tão reais e juntar duplas ou grupos tão improváveis mas que sempre dão certo. 

Alguns exemplos:
* Um pistoleiro sem os dois dedos da mão direita, um viciado em heroína, um menino de treze anos com seu guaxinim/cachorro de estimação e uma mulher sem as duas pernas (Torre Negra)
** Uma das duplas mais incríveis: um surdo mudo e um rapaz com problemas mentais (Dança da Morte) 
*** E uma amizade entre um banqueiro e um criminoso que não aconteceria fora das grades da prisão de Shawshank (Um sonho de liberdade)

     
Roland e seu Ka-Tet _Art by Jay Anacleto /  Tom e Nick art by Mike Perkins /  Filme: Um Sonho de Liberadade




Com a trilogia de Mr.Mercedes não poderia ser diferente, um policial aposentado e em péssimo estado de saúde, um jovem universitário e uma mulher com problemas de ansiedade e transtornos compulsivos.


Sobre a trilogia Bill Hodges :

Um dia Stephen King acordou e se deu conta que nunca escreveu um livro policial no melhor estilo de Sherlock Holmes ou desenvolveu alguma história com os elementos: assassinato, seguir pistas, juntar evidencias e solucionar o caso. Mas, pera aí...estou falando do mestre e ele nunca vai fazer algo convencional.

Cada história tem começo, meio e fim.
Se você não leu o primeiro livro “Mr.Mercedes” pode ler o segundo “Achados e perdidos” sem problema algum, já o terceiro “Ultimo Turno” é a continuação do primeiro, mas se você não leu nenhum dos anteriores vai entender a historia mesmo assim. Acredite, somente quem é mestre na escrita consegue esse feito.

“Mr. Mercedes” 
 Existe o fator sangue na espinha quando você lê “Mr. Mercedes”.
De uns tempos pra cá, vemos nos noticiários vários atentados terroristas em que um louco fundamentalista (ou só louco mesmo) pega um carro e atropela o máximo de pessoas que consegue.
Quando SK escreveu este livro alguns casos haviam acontecido, mas parece que agora esse numero aumenta cada vez mais, infelizmente. Será que ele previu o que iria acontecer nestes últimos anos? 

Podemos considerar o livro como o convencional policial gato e rato, só que desde o começo sabemos quem é o assassino. Então você me pergunta; “Qual a graça se já sei quem é o cara?” Ahh... você não faz a menor idéia da sua motivação e durante a história a coisa fica bem estranha, bem estranha mesmo...vai por mim. Nas ultimas vinte páginas SK dá uma virada na história e consegue escrever um dos finais mais incríveis e de tirar o fôlego para um livro de suspense.

“Achados e Perdidos”
A história gira em torno de livros, escritores e seus fãs. Mesmo com um começo muito bom o resto do livro não traz grandes emoções.O mínimo que posso dizer é que ele se arrasta bastante e tem vários momentos “flash backs” do primeiro livro. Se você ler logo na seqüência pode perder o entusiasmo na leitura. O ponto positivo é que conhecemos melhor o detetive Bill Hodges e sua assistente Holly Gibney e criamos uma empatia com os personagens. Só assim pra chegar até o final da historia, triste...  

“Ùltimo Turno”
Voltamos à historia do assassino da Mercedes, Brady Hartsfield. E agora sabemos que durante seu coma, ele desenvolveu poderes paranormais. É isso mesmo! Era pra ser uma uma thriller policial mas parece que SK não consegue deixar o terror de lado. A história é boa, com alguns elementos no estilo “já li ou vi isso antes” mas nada que compromete a leitura.O que mais achei interessante ou bizarro, foi a maneira que o assassino entra em contato com suas vitimas para que elas cometam suicídio. Na época que comecei a ler “Ultimo Turno” o desafio do “jogo” Baleia Azul já tinha feito algumas vitimas e estava se espalhando pela mídia de forma assustadora. Impossível não ver um paralelo com a historia e isso deixa uma pergunta no ar ...Será que Stephen King previu o futuro? De novo ???


MR MERCEDES
ISBN : 9788556510020   

ACHADOS E PERDIDOS
ISBN : 9788556510075

ULTIMO TURNO
ISBN : 9788556510181

AUTOR : STEPHEN KING
EDITORA : SUMA DAS LETRAS

terça-feira, 1 de agosto de 2017

MY TAKE ON ME - MORTEN HARKET





A importância do A-ha no cenário musical synthpop/tecnopop é inegável.
As más línguas dirão que eles só conseguiram ter sucesso por causa dos vídeos clips ou por seus rostinhos bonitos... pura inveja.

Eles tiveram seus altos e baixos, é verdade. Os álbuns lançados na década 1990 são no mínimo equivocados e esquecíveis, com exceção de três ou quatro músicas.

As carreiras solos? Deixa pra lá...ficaram em um limbo musical por quase 8 anos quando finalmente lançaram o ótimo “Minor Earth Major Sky”.

No livro “My take on Me” o vocalista Morten Harket explica de forma discreta este hiato depois do sucesso mundial na década de 1980 até a retomada da banda no começo dos anos 2000.

Discreta? Sim. Porque se você espera por barracos, lavação de roupa suja no estilo “Casos de família” esqueça! Esse livro passa bem longe disso.


Na verdade, os primeiros capítulos lembram bastante os livros de outro norueguês; Karl Ove Knausgard -“A morte do Pai”. O cenário e época são os mesmos, década de 1970/80 na bela cidade portuária de Kristiansand.

Em um tom bem introspectivo, Morten conta que sofreu bullyng em sua infância:

“O pior do bullying psicológico é achar que os agressores estão certos de alguma forma. Uma parte de mim não gostava da minha aparência, de como eu falava, de eu não ser capaz de me expressar bem . Esse desejo de se encaixar e de ser amado é muito forte – e é muito difícil não ser convencido por ele. Eu estava disposto a vender algo de mim mesmo para obter reconhecimento. Ao mesmo tempo, tinha consciência do que estava fazendo, através de vislumbres de mim mesmo , bancando o cão submisso, que tentava agradar aos outros. O fato de que não me dobrei completamente às exigências vinha da confiança dentro de mim, que só reconheci tempos depois.” 

“Jamais pensei em suicídio, mas consigo entender porque o motivo pelo qual as crianças nessa situação levam isso em consideração.Pode ser um lugar muito solitário, suspenso no tempo, sem luz no fim do túnel”  

O refugio de Morten para essas perseguições constantes dos “colegas” de escola foi na natureza.
Aprendeu a cultivar orquídeas, colecionava de borboletas e depois começou a levar para casa alguns animais não tão convencionais como mariposas, lagartos e jabutis.

A musica estava presente em sua vida desde criança mas nunca foi sua primeira opção. Antes o cantor entrou no exercito, começou a estudar a bíblia e pensou em se tornar ministro da igreja ! Começou a cantar em uma banda de covers mas sem futuro algum e foi nessa época que conheceu Magne Furuholmen e Påul Waaktaar, que também tinham uma banda sem futuro algum. O sonho de fazer sucesso fora da Noruega começa a tomar forma quando o trio vai para Londres, na tentativa de conseguir um contrato com alguma gravadora.

Antes da internet, MP3,Youtube, I-Tunes, Spotify...  as bandas gravavam uma fita K7 demo com algumas musicas, batiam de porta em porta nas gravadoras e rádios e faziam shows praticamente de graça. Se algum produtor ouvisse a fita ou fosse ao show já era meio caminho andado para gravar um single. Quando os três jovens noruegueses já cansados de esperar, sem esperanças e sem dinheiro para continuar na Inglaterra preparavam suas malas para voltar para casa... a sorte deles muda radicalmente.

A trajetória da banda pode parecer a mais inocente de todas para aqueles que estão acostumados com sexo, drogas e rock’n’roll. Novamente, não espere por revelações bombásticas, dramas ou brigas.

Morten conta o básico: alguns namoros, assédios de fãs e uma ex que deu entrevistas para tabloides ingleses contando que o cantor tinha “hábitos sexuais estranhos” mas nada além disso. Lembra também do Rock in Rio de 1991 e uma aventura bizarra na Amazônia. É um livro voltado para fãs da banda e pessoas que viveram ou gostam muito dos anos 1980. Possui muitos pontos positivos e Morten é um cara bem otimista


Talvez essa maneira de ser; simples, tranqüila e reservada seja algo bem típico dos noruegueses.
E o amor e respeito que eles tem pela natureza também é notório.

“Somos movidos pelos hormônios, pela ansiedade e por segundas intenções. E não pela sabedoria resultante de uma infinidade de experiências. Há pouquíssima mente livre de dogmas por trás da maioria das coisas que fazemos. Infelizmente, para todos nós – e também para a natureza - , por meio de nosso sucesso nos tornamos uma monocultura agourenta na natureza. E para a natureza, que cuida de todas as coisas, nós nos transformamos em sua erva daninha.”




MY TAKE ON ME - MORTEN HARKET BIOGRAFIA 
AUTOR : MORTEN HARKET / TOM BROMLEY
EDITORA : FARO EDITORIAL 
ISBN : 9788562409936